segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

A dimensão plástica da irrelevância


Com um sorriso no rosto, a menina voltava a gozar a liberdade que haviam lhe tomado. 54 dias de privação. Os arautos da liberdade de expressão, os defensores das minorias e de tudo o que é bom, belo e puro sorriram juntos. Carolina Pivetta da Motta, nome de batismo da “pichadora da bienal”, enfim, estava livre para voltar à rotina. Rotina? Infelizmente parece que ela não a tem. Mesmo alçada à condição de símbolo de resistência, personificação de todas as injustiças, acho que menina não terá muito a fazer.

Carol (trato-a com intimidade, já que, agora, ela faz parte de nosso universo) pertence a uma categoria de seres que crêem doentiamente que têm algo a dizer. Ela precisa expressar sua verdade revelada, para o bem daqueles que ainda vivem nas trevas. Sem sua transgressão, sem a interferência de seu grupo no design da cidade, a vida fica muito mais triste. Aliás, a simples idéia de “transgredir”, independentemente de por que e do que se transgride, parece justificar qualquer banalidade, qualquer barulho, qualquer violência. É a linguagem dos libertários, dos descolados.

É uma leviandade dizer que, ao optarem por cobrir as ruas da cidade com seus garranchos, pessoas como Caroline Pivetta desejam apenas sair do anonimato, serem reconhecidas. É muito mais do que isso: querem é despir-se de sua (nossa) bruta irrelevância. E a verdade é que um dos grandes dramas da vida humana é justamente este: somos relevantes apenas para um número muito reduzido de pessoas. Todos nós. E essa falta de importância – que é produto da própria arquitetura do mundo – para alguns é insuportável.

Caroline decerto não se considera uma criminosa; mas aposto que se tem por genial, por única. Quer nos mostrar, por meio de seus 37 rabiscos em diferentes “picos” da cidade, uma verdade que ela crê ter descoberto. E, como eficiente ministra da Ordem Superior, apresenta-nos – mesmo que à força – aquilo que sem ela seríamos incapazes de perceber. Sua brutalidade gráfica é, na verdade, catequizante.

O lamentável é que não damos bola para as “intervenções” de Carolina. Achamos aquilo uma grosseria, uma provocação violenta e tola. Não tenho nenhum interesse em enxergar a verdade sublimada na grafia marginal. E, para esse espírito mimado, nada é mais doloroso do que viver prisioneira da própria irrelevância. Livre. Mas apenas juridicamente. Por mais que lhe digam o contrário, Carol, as cadeias da insignificância ainda nos cercam.

3 comentários:

Anônimo disse...

Seria muito mais inteligente e útil se ela "protestasse" fazendo o bem ao próximo, ou fazendo arte de verdade.
Um feliz Natal a vocês e aos seus.

Grande abraço,

Pablo
http://cadeorevisor.wordpress.com

Anônimo disse...

"Arte de verdade"? Hahahaha. Eis o arauto da crítica!

Seria ótimo se mais gente quisesse sair do estado de irrelevância, como você chama a condição humana de não ser capaz de muita coisa. Mas são esses pequenos erros, essas coisinhas de gente mimada que nos fazem sair do estado de letargia - esse que o senso comum (igualado ao bom senso, oh céus) diz que é natural-que-seja-assim.

Faltou alguém dizer Ordem e Progresso.

Anônimo disse...

Irrelevância.

Esta é a palavra mais adequada. Agora que já se passou algum tempo desde o incidente da bienal, quem é esta moça? O que fez desde então? Vai precisar invadir outro espaço, impor a sua "arte" na marra, como fez daquela vez, para tentar ser notada? Ganhar mais umas manchetes, receber elogios de quem não passou da adolescência e acha qualquer coisa válida apenas porque agride o gosto-comum... o tal senso-comum?

Não é a nossa bruta irrelevância que estes 'artistas' querem atacar, na base da truculência. É a deles mesmos, só isso.

@rjflavio