sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Liberdade da vontade, vontade de sentido, sentido da vida


É um equívoco afirmar que Viktor Frankl desenvolveu a logoterapia a partir de sua experiência no campo de concentração. Quando foi enviado para Auschwitz, ele já possuía o manuscrito de seu livro “The doctor and the soul”, no qual desenvolvia todos os fundamentos de sua teoria. Antes mesmo de ser enviado ao campo, ele já tinha a convicção de que a vida tem sentido, um sentido incondicional. E tal convicção sobreviveu ao campo: isso não é pouca coisa! Seu legado é bastante extenso, mas os três pilares sobre os quais se assenta toda a logoterapia são: liberdade da vontade, vontade de sentido e sentido da vida.

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Para Frankl, o homem é essencialmente livre. É importante, no entanto, compreender de maneira adequada o que se pretende dizer com isso. Liberdade não é onipotência. Obviamente, ele não nega o que o homem esteja sujeito a condicionamentos do meio social, de seu psiquismo ou de sua biologia. Mas, para além de todos esses condicionamentos, resta ao homem a liberdade última de se posicionar diante deles.

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Embora reconhecesse o valor das escolas de psicoterapia que o precederam, a saber, a psicanálise de Freud e a Psicologia Individual de Alfred Adler, Viktor Frankl diverge delas num ponto fundamental: enquanto Freud afirma que o homem vive em busca do prazer, e Adler diz que o homem está em busca do poder, Frankl vai dizer que o homem está, na verdade, em busca de sentido. Para Frankl, há no homem um desejo básico e fundamental, algo que é especificamente humano: a vontade de sentido.

(Ressalva: essa apresentação esquemática é uma vulgarização extrema, sei que a coisa não é bem assim)

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Como ele diz em um de seus livros, a existência da sede é prova de que existe a água. O mesmo vale para o sentido da vida: se os homens têm essa vontade inerente, deve haver o sentido.

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Mas, afinal de contas, quem é Viktor Frankl, o que é Logoterapia, qual é o sentido da vida? Se você quer saber a resposta dessas e outras perguntas, não perca o Curso de Introdução à Logoterapia oferecido pela SOBRAL (Sociedade Brasileira de Logoterapia), a ser realizado no próximo dia 07/02, no Instituto Pio XI. Para mais informações, clique aqui.

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Caso não possa comparecer, leia Em busca de Sentido, Sede de Sentido e Psicoterapia e sentido da vida. Claro, se puder fazer o curso e as leituras, tanto melhor.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Amenidades



Na última sexta-feira, aconteceu em São Paulo a festa All the beats, promovida pela dupla Jr. Deep e Guilherme Lopes, o Drumagick. Festa de alto nível, música da melhor qualidade, público bacana, enfim, condições bastante favoráveis para uma noite de descontração. Na pista principal, o próprio Drumagick aqueceu a pista para, em seguida, o DJ Andy, recém chegado da Europa, apresentar o seu set.

Uma porção de DJs e produtores compareceu. Entre eles, o ilustre DJ Marky. Esse texto, na verdade, pretende reportar um bate-papo que rolou com ele já no final da festa, enquanto o Marnel fazia o seu set na pista principal. Uma oportunidade única: na mesma roda, DJ Andy, DJ Marky e, bem, digamos, friends...

Pudemos ouvir várias histórias do início da carreira: falaram sobre lugares ermos onde já tocaram, relembraram de pessoas que participaram dos primórdios da cena de música eletrônica no Brasil e que hoje tomaram caminhos diversos (o Andy falou sobre um cara que hoje tem um carro de pamonha!). Depois dessa sessão nostalgia, Marky mencionou problemas de bastidores que o público dificilmente fica sabendo. Por exemplo, o calote que ele e outros artistas sofreram de uma gravadora pretensamente dedicada à música underground.

Falou um pouco sobre sua rotina. Entre outras coisas, disse que não ouve drum’n’bass em seu dia-a-dia. Afirmou que ouve muita bossa-nova e coisas diversas, de onde lhe surge a inspiração para evitar uma produção viciada. Disse que hoje já não mais precisa comprar discos – ele os recebe diretamente de outros produtores. Afirmou que dedica parte de seu tempo a ouvir o material que recebe e que, no final das contas, acaba tocando somente o que gosta, afinal, recebe muita coisa boa, mas uma porção de irrelevâncias também.

O ponto alto da conversa, na minha modesta opinião, foi a resposta ao ousado comentário de uma das meninas que estavam na roda:

Marky, estou surpresa com essa sua humildade hoje...

A resposta foi formidável. Cito de memória, mas foi algo bem próximo disso:

Está surpresa porque muita gente que nem me conhece, que nunca conversou comigo, fala um monte de bosta. Vocês não estão aqui, conversando comigo, normal? Então, não tem essa de o Marky é estrela e o caramba. Todo mundo é igual, todo mundo vai pro mesmo buraco...

Talvez, se eu não tivesse presenciado a resposta e visto a forma como ele conversava com todos os que se aproximavam, eu recebesse essa resposta com algum ceticismo. Mas seu procedimento estava à frente de suas palavras. No fim, é isso. DJ Marky merece todo o destaque que conquistou.

Big up.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

O dia em que concordei com Marcos Bagno

Quem me conhece sabe o quanto pode ser espantosa essa afirmação. Não gosto de seu tom excessivamente panfletário, nem de sua demagogia, nem de sua esquerdice — coisas, aliás, afins nos tempos em que vivemos. Mas há algo mais espantoso: o que vai a seguir é um texto que foi publicado pela revista "Caros Amigos". Cheguei ao tal artigo mais ou menos por acaso. E se o reproduzo, é apenas para dizer que, sim, a análise que faz está correta. Eu mesmo, durante a graduação, cheguei a dar aulas de redação para uma turma chamada "Equalização". Era uma aula oferecida aos sábados, que pretendia justamente reagir a esse problema: futuros professores semiletrados (termo empregado como uma descrição literal, sem nenhuma conotoção pejorativa). Lembro-me de que essas aulas deveriam acontecer aos sábados pela manhã e de forma gratuita. Escrevi deveriam porque já na segunda aula, os dois alunos que compareceram se evadiram. Ou seja: uma iniciativa institucional para favorecer alunos necessitados não recebeu nenhum tipo de interesse por parte daqueles a quem pretendia beneficiar. E assim é a vida. Pode-se obrigar o jumento a ir até a fonte, mas não obrigá-lo a beber água...

Segue o texto:

A CATÁSTROFE DOS CURSOS DE LETRAS
Marcos Bagno - Novembro de 2008

A formação dos professores de português, hoje, no Brasil, é uma catástrofe. Nós, os responsáveis pelos cursos de Letras, não enxergamos a bomba-relógio que temos nas mãos. As estatísticas não mentem: a retumbante maioria dos estudantes de Letras vêm de camadas sociais pobres ou mesmo miseráveis, filhos de pais analfabetos ou que têm escolarização inferior a quatro anos. Isso significa muita coisa. Significa que esses estudantes têm um histórico de letramento muito reduzido: no ambiente familiar, não convivem com a cultura letrada, não têm acesso a livros, revistas, enciclopédias etc. Significa que não são falantes das normas urbanas de prestígio (as mesmas que supostamente terão de ensinar a seus futuros alunos) e têm domínio escasso da leitura e da escrita. Só na faculdade é que a maioria deles vai ler, pela primeira vez na vida, um romance inteiro ou um texto teórico. Vêm, quase todos, do ensino público, essa tragédia ecológica brasileira muito pior que as queimadas na Amazônia. Nós, porém, fingimos que eles são ótimos leitores e redatores, e despejamos sobre eles, logo no primeiro semestre, teorias sofisticadas, que exigem alto poder de abstração e familiaridade com a reflexão filosófica, e textos de literatura clássica, escritos numa língua que para eles é quase estrangeira. E assim vamos nos iludindo e iludindo os estudantes.

O resultado é que os estudantes de Letras saem diplomados sem saber lingüística, sem saber teoria e crítica literária e sem saber escrever um texto acadêmico com pé e cabeça. Todos os dias, recebo mensagens de formandos que me pedem orientação para seus trabalhos finais. Alguns até me enviam seus projetos. São textos repletos de erros primários de ortografia, pontuação, sintaxe, vocabulário, com frases truncadas e sem sentido. Assim eles chegam ao final do curso, e suas monografias, mal escritas, sem nenhum rigor teórico ou metodológico, são aprovadas alegre e irresponsavelmente por seus supostos orientadores.

O problema, é claro, não está no fato (que merece comemoração) de acolhermos na universidade alunos vindos das camadas mais desfavorecidas da população. O problema é não oferecermos a eles condições de, primeiro, se familiarizar com o mundo acadêmico, que lhes é totalmente estranho, por meio de cursos intensivos (e exclusivos) de leitura e produção de textos, de muita leitura e muita produção de textos, para só depois desses (no mínimo) dois anos de preparação eles poderem começar a adentrar o terreno das teorias, das reflexões filosóficas, da alta literatura. Se não fizermos isso urgentemente (anteontem!), as salas de aula do ensino básico estarão ocupadas por professores que, mal sabendo ler e escrever adequadamente, não poderão desempenhar sua principal tarefa: ensinar a ler e a escrever adequadamente! Não sei, aliás, por que escrevi "estarão ocupadas": elas já estão ocupadas, neste momento, por essas pessoas, de quem se cobra tanto e a quem não se oferece uma formação docente que também seja, minimamente, decente.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

O Coro Pacifista


Por Elton Frederick:

A busca pela paz, entendida aqui em seu sentido mais amplo, que abrange a substituição da violência pelo diálogo, a inimizade pela amizade, o ódio pelo amor, seria o mais nobre dos anseios humanos, o objetivo último da civilização. A guerra representaria o que temos de obscuro, o atraso; a paz, o clarão das luzes, o moderno. E isso fica patente em tempos de prélio: o discurso pacifista surge com força e autoridade, convidando os defensores do bem a se manifestarem em favor daqueles que ora choram por seus mortos.

Há um velho ditado, oriundo dos confins do senso comum, que assegura que as guerras não produzem vencedores ou vencidos: todos perdem. A máxima leva em conta aquilo que seria uma espécie de “sentimento comum”, presente em todo homem, que faz com que as inúmeras mortes, a destruição e o sofrimento de nossos “irmãos” nos tornem — agredidos ou agressores — derrotados. "A morte de qualquer homem me diminui, porque faço parte da humanidade", re-poetaria John Donne, ao ver nossas mais recentes desventuras.

Abro um parêntese: os que hoje gritam por paz na Terra são os mesmos que não hesitam em amaldiçoar até a décima geração daqueles que ousarem lhes aplicar uma fechada no trânsito; são os mesmos que não pensam duas vezes antes de esbofetear um vizinho barulhento. A solidariedade a distância sempre traz consigo um hálito de hipocrisia. Fecho o parêntese.

O conflito entre o exército de Israel e os terroristas do Hamas na Faixa de Gaza, além de desnudar, mais uma vez, o delicado estado de coisas na região, mostra a inocência do coro pacifista. Aquilo que seria um indício de esperança – dado o número de manifestações pedindo o fim do conflito, e a quase unânime sensação de que a luta armada é um mal que precisa ser extirpado – me parece, ao contrário, um claro sinal ingenuidade, misturado à mais repudiável forma de caradurismo político: a demagogia.

Se entendermos a guerra como o exercício da política por outros meios, fica claro que os conflitos resultam em vencedores e vencidos, a despeito do “sentimento comum” que nos uniria em nome da paz. É evidente que a morte de civis – penso nas crianças que morrem e naquelas que viverão sem a certeza de futuro – é algo repudiável; é comovente ver escolas destruídas, pessoas desabrigadas e famintas, e isso nos causa horror. Todavia, esse é um aspecto que, a meu ver, está embutido no cálculo do beligerante, razão pela qual não faz muito sentido apelar para os escrúpulos humanistas das partes em conflito. Trata-se, obviamente, de uma equação macabra, porém real.

Além disso, me parece uma medida contraproducente repudiar os conflitos sem apresentar algo que os substitua. Sim, porque a paz – tal como é apresentada por nossos beatos – não é uma concorrente à altura da guerra. A paz como um mero vocábulo, que não carrega consigo um conjunto de valores que nos ajudem a suplantar a guerra, é, a meu ver, conversa fiada, uma gratuidade que não nos leva a lugar algum, que não resulta em nada. Serve apenas para manifestar um bom-mocismo artificial.

A simples renúncia à guerra não resolve os conflitos que ela se propõe a sanar. Pensa-se, ingênua ou desonestamente, que para acabar com as batalhas basta não desejá-las, reprimir determinadas paixões e tratar as armas como algo sujo, frutos da estupidez humana. E não se trata de insensibilidade: o que quero dizer é que a guerra ainda é, infelizmente, o caminho mais eficaz para a resolução de controvérsias, depois que todos os esforços chamados “diplomáticos” são esgotados. É a versão menos vulgar do “Existem coisas que só se resolvem na porrada”.

A guerra não é um instinto; trata-se de uma invenção que, em muitas ocasiões, solucionou controvérsias que pareceriam insolucionáveis. Enquanto a paz também não for “inventada”, calculada para atender as demandas que ora são respondidas pelas armas; enquanto for apenas um discurso bonitinho e ordinário, a guerra será sempre uma opção a ser considerada. Lamentavelmente.

domingo, 4 de janeiro de 2009

O edifício do conhecimento

Sabem o que descobri?
Que as lacunas em minha formação não são de todo inofensivas. O prédio não se sustenta por causa delas...

Ano novo, ânimo novo!