sexta-feira, 10 de outubro de 2008

A cara do leão


Nos corredores do Conjunto Nacional, se via uma dessas jovens mães, descoladas, com seus óculos de armação grossa, botas e cachecol. O que ela tinha de curioso era o olhar atônito, um semblante de preocupação, como de quem perdeu algo importante:
– Lucas... Lucas? Cadê você? Chega, vai... Vamos, Luquinha! Acabou a brincadeira, vamos embora.
Quem circula por aquela bandas sabe que não é nada usual ver alguém gritando (um grito comedido, é fato, mas, ainda assim, grito) por aqueles corredores. Aos poucos, a mulher começou a ser tomada por uma aflição, um desespero, uma vontade de chorar... O tempo, claro, passava. Lá se iam mais de 30 minutos desde que o menino foi se esconder. A tensão não parava de crescer. Por fim, ela resolve perguntar para o segurança. Um suspiro e:
– Por gentileza, o senhor viu um menino de óculos, com uma jaqueta laranja por aí? Estávamos brincando de esconder quando, depois de quase derrubar a estátua do D. Quixote, ele resolveu ir se esconder mais longe.
– Infelizmente, senhora, não vi, não.
O rádio do segurança é acionado.
– Na escuta... Tumulto na Livraria Cultura? Ok, estou indo para lá.
– Moço, o senhor não vai me ajudar?
– Desculpe, senhora. Meu trabalho é mais importante do que te ajudar a encontrar um garoto traquinas que sabe se esconder.
A mulher, já atordoada, perambula aleatoriamente até que vê uma pequena aglomeração se formando na porta da Livraria. Avista, então, o garotinho com tantos livros quantos era capaz de carregar. Como quem não se dá conta da aglomeração ou da preocupação da mãe, o menino olha para ela, sorri e diz aliviado:
– Que bom que você chegou, mamãe. Eu achei a caixinha do Aslam, mas o homi não quer me deixar levar...
– Aqui o tempo não pára durante as aventuras infantis — pensou a mãe.

***

Mais um que vai para o concurso. Gostei da idéia. Acho que serviu ao menos para eu me desinibir e arriscar escrever alguma ficção. Será, será?

Um comentário:

Marie Tourvel disse...

Não tem nem que perguntar. Já deveria ter se arriscado há muito tempo, querido. Beijo!